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quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Deus e a criação, na visão da filosofia grega e hindu

No sistema filosófico de Aristóteles não é Deus o criador do universo mas a causa de seu movimento. Porque o criador é um sonhador, e um sonhador é uma personalidade insatisfeita, alma que anseia por algo que não existe, ser infeliz que busca a felicidade- em suma, criatura imperfeita que aspira à perfeição. Mas Deus é perfeito e, sendo perfeito, não pode ser insatisfeito ou infeliz. Não é, portanto, criador mas o motor do universo.

Mas que espécie de motor? A essa pergunta responde Aristóteles que Deus é o motor não movido do universo. Toda e qualquer outra fonte de movimento do mundo, seja uma pessoa, seja um coisa, seja um pensamento, é ( de acordo com Aristóteles) um motor movido. Dessa sorte, o arado move a terra, a mão move o arado, o cérebro move a mão, o desejo de alimento move o cérebro, o instinto da vida move o desejo de alimento, e assim por diante. Em outras palavras, a causa de todo o movimento é o resultado de outro movimento qualquer. O amo de todo escravo é o escravo de algum outro amo. O próprio tirano é escravo de sua ambição. Deus, no entanto, não pode ser escravo de nenhuma ação. Não pode ser escravo de amo nenhum. É a fonte de toda a ação, o amo de todos os amos, o instigador de todo o pensamento, o motor não movido do mundo.

Além disso, Deus não se interessa pelo mundo, muito embora se interesse o mundo por Deus. Pois interessar-se pelo mundo significa sujeitar-se a uma emoção, deixar-se mover por preces ou imprecações, ser capaz de modificar o próprio espírito em virtude das ações, desejos ou pensamentos alheios- em suma, ser imperfeito. Mas Deus é sem paixão, imutável, perfeito. Move o mundo como um amante move o objeto amado. Passa pela rua uma formosa mulher. Embebida pelos próprios pensamentos, traz os olhos fitos no chão. Não olha para ninguém. Mas toda a gente a contempla. A presença de sua beleza fez com que todos os olhares se voltassem, emocionou todos os corações, gerou pensamentos em todos os espíritos. Tal é a natureza da beleza de Deus. Sem ser movido, " produz movimento dentro de todos nós por ser amado".

Esse Deus aristotélico, amado de todos os homens e indiferente a seus destinos, é um Ser Supremo, frio, impessoal e, do nosso ponto de vista religioso moderno, " perfeitamente" insatisfatório. Mais se assemelha à Energia Primeira dos cientistas que ao Pai Celestial dos poetas. O espírito humano, divorciado de toda emoção, pode ser capaz de conceber tal governante desinteressado do universo. Todavia, o coração humano, com a sua carga  de tristeza e a sua capacidade de compaixão insiste sobre um Deus que mais seja um Amigo Amante no céu que uma abstração, destituída de amor, nas especulações metafísicas de um filósofo grego. Mais próximo, talvez, do mistério essencial do mundo está o coração do que o cérebro. 

Quanto à validez científica da especulação aristotélica sobre o motor não movido, ou a causa não criada de todo movimento, a fraqueza da posição de Aristóteles é bem sintetizada pelas palavras da menininha que perguntou : "Mas, mamãe, quem é que fez Deus?"


Fonte : Vidas Notáveis, 1979, Porto Alegre- Editora Globo.


Existem coisas que vão além da nossa percepção materialista. O crítico acima descreve em síntese as considerações de Aristóteles sobre Deus. Na filosofia hindu, a criação cósmica nada mais é do que a condensação onírica dos pensamentos divinos. Assim, para que se consolidasse, Deus começou a pensar e projetar a condensar a luz atômica em prótons e elétrons. Deus deu força adicional para que se organizassem em átomos e moléculas e por conseguinte gases, calor, líquidos e sólidos. E tudo isso de acordo com Sua ideia-sonho. E depois nos materializou para que começassemos a usufruir toda a criação onírica Dele, da alegria dele. 

Deus anseia por nosso amor

Perguntei a Deus por que Ele fez esta criação : "Era necessária para Ti'?" Ele respondeu: " Não, mas Eu não tinha ninguém com quem compartilhar Minha alegria." Assim, Ele tornou-se o Criador, mas com uma condição: imporia a Si Próprio a mesma busca, o mesmo anseio que impôs a Suas criaturas. Todos procuram alguma coisa, pela felicidade que acreditam que aquilo lhes dará. Mas as pessoas não encontram a verdadeira felicidade, pois toda avenidade ganho material termina num beco sem saída. Você deseja uma coisa somente até tê-la. Quando a consegue, o prazer diminui até que a alegria se acaba. A maioria das pessoas acha que a vida é apenas nascer, casar, ter filhos, ganhar dinheiro, gozar alguns prazeres efêmeros e morrer, Mas esta não é a verdade. Deus diz: " Eu impus o mesmo nível de dificuldade  a Mim e a Meus filhos. Como eles não estão encontrando a satisfação, Eu também ainda não encontrei o que quero" E o que é que Deus anseia? Nosso amor, nossa atenção. Ele tornou tudo muito difícil para Si Mesmo, pois deu livre-arbítrio aos seres humanos para que O buscassem ou rejeitassem. Deus diz: "Vou atrás de cada coração, esperando que Meus filhos desprezem Minha criação e se voltei para Mim". É um grande pensamento: perceber que Ele impôs a Si próprio o mesmo "exílio" imposto a nós; perceber que Deus também busca alguma coisa: o nosso amor.

Paramahansa Yogananda, do livro Romance com Deus.

4 comentários:

  1. http://soumdot.blogspot.pt/

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  2. Leio no momento obras de Luc Ferry que elabora esse questionamento que você propõe através de tão rico e denso texto: nossa entrega ao eterno e verdadeiro amor! Ainda engatinhamos nesse aspecto!
    Abraço.

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  3. Um texto que impõe uma reflexão sobre como vemos e sentimos nós o Deus em que acreditamos.
    Eu não creio num Deus capaz de criar uma criatura e desinteressar-se dela.
    Um abraço

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