Na atualidade precisamos recorrer não somente aos tratados espirituais, mas, sobretudo, aos grandes mestres da espiritualidade para sermos pessoas mais contemplativas e, ao mesmo tempo, mais humanas. Na vida dos místicos está o itinerário fundamental para a libertação interior do indivíduo: o encontro com Jesus de Nazaré! Nele e por Ele somos capazes de adentrar o mistério de Deus!
Infelizmente ainda é intensa a quantidade de pessoas que se distanciam da experiência da fé. Esperam chegar à terceira idade para assumirem uma vida de conversão em Deus. Muitos são aqueles que pensam a espiritualidade como um meio de tolir a nossa liberdade. Espiritualidade seria sinônimo de carolice, fechamento, isolamento das pessoas e das coisas boas da vida, resignação e sofrimento.
Viver espiritualmente não é uma perda, mas um ganho da pessoa humana. Ganhamos em qualidade de vida ao nos tornamos pessoas redimidas pela experiência de Deus. Nossa vida ganha sentido, nosso coração lucra um norte e nossa história se investe em esperança! Parece até uma linguagem capitalista, todavia é só uma forma de linguagem para expressar que Deus não nos tira nada, pois é pura gratuidade. A única coisa que perdemos é aquilo que nos afasta de seu amor de Pai e de sua ternura de Mãe.
O objetivo maior da vida espiritual é comunicar às pessoas o cenário do Transcendente e a hierofania do Sagrado no tempo. É um caminho de silêncio e de busca incessante pela face do Divino que se apresenta na solidão acompanhada pelo humano. Aqui a oração se apresenta como essencial para a vivência do Reino de Deus. A oração é o hálito da alma e a experiência fundamental para o reconhecimento da necessidade que temos de Deus. Por meio da oração, a espiritualidade é gestada no interior da pessoa humana.
Vivenciada interiormente a espiritualidade torna-se manifestação de Deus no mundo. Logo depois vem a leitura bíblica, como devoção e não como debate teológico. Em seguida está a entrega contínua à vontade de Deus e por fim, seguem as demais realidades: na autodisciplina, na orientação pelo Espírito Santo, na virtude do amor e no julgamento prático. Na experiência mística a oração se volta para a conversão do “eu interior”: é o momento do “estar a sós” para que o Divino se torne humano e o humano de torne Divino, em um movimento contínuo da encarnação de um no outro, sem simbiose, mas na reciprocidade existencial dos dois seres ontológicos.
Por meio da espiritualidade histórica a mística torna-se a proclamação da liberdade e da fidelidade em Jesus de Nazaré. Assim continuamos a missão redentora de Jesus na peregrinação interior pelas trilhas do mundo. Aprendemos a olhar o mundo e o tempo na ótica de Deus. Diante das dificuldades na peregrinação interior no mundo, Deus se apresenta como o único recurso seguro e eterno. Posteriormente a espiritualidade nos convoca a uma vida piedosa em Deus e a luta paulatina contra a intolerância à justiça e a favor da fraternidade entre os povos.
Por outro lado, a espiritualidade também insiste que a mensagem bíblica não deve ficar somente nos redutos, mas deve ser antes impregnada ao coração, para ser vivenciada e testemunhada no mundo. Assim nos tornamos “andarilhos de Cristo” na sociedade.
Na essência da espiritualidade está a dedicação de oferecer-se a Deus sempre e em todo lugar. Viver uma vida de oblação na escola da caridade! Tornamos-nos pessoas atentas às necessidades do mundo. Somos capazes de reconhecer no rosto dos pobres o rosto de Cristo, que ainda peregrina no sofrimento humano. Nossos tímpanos são rompidos pelos gritos de dor e desespero que emanam no coração do mundo. A espiritualidade nos ensina o limite da vida e constrói em nós um coração próximo ao de Deus! Por isso, que ao falar de espiritualidade é impossível dissociá-la da conversão da pessoa humana. As raízes do nosso ser são transformadas por meio da experiência em Deus.
Por fim, a espiritualidade não se reduz às técnicas de oração nem somente a caminhos para a meditação. Pelo contrário, ela está presente na gênese da experiência da fé. A espiritualidade também não é só conceito, mas, principalmente vivência eficaz e assaz, com conceitos vivos e sem ambiguidades, do mistério de Deus. A espiritualidade é precisa, simples e extremamente esclarecedora. Resume-se em um modo de ser e viver, no mundo, sob a ótica de Deus. Que estejamos abertos para permitir que Deus possa “ser e viver” em nós!
Pe. Robson de Oliveira, C.Ss.R.
Reitor da Basílica de Trindade
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